Carta ou (de novo) a volta
Conferindo a lista de textos que tenho deixado pela internet afora, percebo que desde março não faço algo decente, devidamente assinado por mim ou que o valha. Não que eu tenha sentido falta, muito menos que alguém além de uma pessoa tenha passado e-mail reclamando o sumiço. Até porque as pessoas de todo-dia sabem que foi preciso mais um tempo, de outro tempo, para submergir outra vez em mim mesmo e de lá voltar somente quando tudo parecesse melhor.Ou melhorado, ou acostumado. Ou ainda transformado. Acontece que hoje, domingo, nessa leva de filmes que a gente sempre acaba assistindo, pus no dvd as Filhas do Vento. Altamente recomendável, principalmente para quem (como eu) é mineiro. No filme duas atrizes (uma delas a Ruth de Souza, a outra agora não lembro o nome) falam o texto abaixo:
A lista de mortos da gente vai aumentando com o tempo.
Quando eu era pequena não tinha noção desse morre, nasce...
Tudo durava tanto, e a vida não faltava.
A vida era pontual como os quintais, as goiabeiras ali
Todo dia ali existindo.
Eu não tinha a mínima noção desse vaivém,
Desse revezamento da humanidade.
Quem vai para o saque, quem sai do jogo,
Quem é escalado, quem vai para a reserva.
Agora não.
Agora morreu Tião Sá, o filho do Joelson,
Fellini, Grande Otelo, Glauber, Milton Santos
E tantas mil gentes engrossando a fileira da bola fora.
Deus, com certeza, ri. Não de sarcasmo
Mas pelo costume de ver passar as boiadas.
De olhar para elas despencando na curva final das planícies...
Pra onde? Só Deus sabe.
É por isso que Ele ri.
Daí que depois de uma coisa tão linda e simples deu vontade enfim de voltar a escrever, nem que seja para copiar esse poema que não-sei-quem escreveu e publicar por aqui. Eu estava era sem vontade mesmo; sem tempo também porque a vida me pediu uma parcela de luta em que os dias tinham 30 horas úteis. Mas principalmente sem vontade, um tempo sem conseguir organizar bem os pensamentos.
Nesse período perdi meu pai (tem exatos quinze dias isso) após três anos de um tratamento doído. Ainda estou na fase de reorganizar os sentimentos. E principalmente entender que alguns detalhes cotidianos (como ele atender ao telefone e eu sempre insistir em falar com a minha mãe) não vão mais se repetir. Tudo acaba se ajeitando, e daqui umas mudanças de lua consigo falar claro sobre isso. Torço até para breve conseguir entender o que eu realmente sinto por ele.
Uma coisa, só uma, já entendi: cresci. Porque vou dormir com pensamentos angustiados iguais aqueles de adultos que querem uma vida melhor, porque me preocupo com coisas que eu antes nem sabiam que existiam, porque quero um tipo de conforto que antes não me fazia falta, porque passei a não ter medo de morrer, para no instante seguinte voltar a temer só porque sinto que ainda não cumpri tudo o que devia. Até lá escrevo. E até lá, quem passar por aqui, ou por algum outro canto que eu esteja, lê.
Um abraço a todos,